Você provavelmente já ouvir falar de Wicked em algum momento ou, pelo menos, esbarrou com o icônico pôster da peça por aí. Wicked é um musical estadunidense que teve sua estreia no teatro em 2003 e se tornou a segunda maior bilheteria da história da Broadway, ficando atrás apenas de O Rei Leão. A história vem de uma trilha de inspirações: em 1900, L. Frank Baum publicou o livro O Mágico de Oz, que teve a adaptação famosíssima para o cinema em 1939. Inspirado pelo livro e filme, Gregory Maguire escreveu Wicked: The Life and Times of the Wicked Witch of the West (que na tradução brasileira é apenas Wicked), que imagina como havia sido a vida da Bruxa Má do Oeste na juventude e a sua relação com Glinda, a bruxa boa, antes dos acontecimentos de O Mágico de Oz. É com base neste último livro que a peça Wicked foi criada, com músicas e letras de Stephen Schwartz e o livreto da peça por Winnie Holzman (que também é responsável pelo roteiro do filme, junto com Dana Fox). A dupla de protagonistas do elenco original - que antes dos títulos que recebem eram apenas Elphaba e Galinda - era interpretada por Idina Menzel (Elphaba) e Kristin Chenoweth (Galinda), que tornaram o musical ainda mais icônico, e algumas das músicas principais, como Popular e Defying Gravity, verdadeiros clássicos. O filme é uma adaptação direta da peça, contando com os mesmos elementos, acontecimentos, personagens e músicas. A nova adaptação foi divida em duas partes, sendo esta a primeira e a parte II prevista para ser lançada em novembro de 2025.
Em Wicked (2024, dirigido por Jon M. Chu), Elphaba (Cynthia Erivo) é filha do governador e uma garotinha que, por uma mistura de motivos, nasceu verde e com imensos poderes que ela não sabe bem como controlar. A cor da sua pele é motivo de chacota entre as outras crianças, vergonha por parte de sua família e, depois que ela cresce, repulsa entre os adolescentes e adultos. Elphaba cresceu com essa rejeição, sendo acolhida pelos animais (que em Oz falam e vivem socialmente como os humanos) e se recolhendo em seu interior. Tudo muda quando sua irmã Nessarose (Marissa Bode) entra uma espécie de faculdade no mundo de Oz e, ao ajudá-la a se instalar, Elphaba acaba chamando a atenção de Madame Morrible (Michell Yeoh), professora de magia. Ali ela vai conhecer Galinda (Ariana Grande), a menina perfeita e altamente popular que também quer ser feiticeira. Elphaba vai fazer amigos, ter interesses amorosos e aprender a dominar seus poderes, que não passam despercebidos ao Grande Mágico de Oz (Jeff Golblum), capaz de conceder a quem o visita qualquer desejo.
Em tempos como os nossos, qualquer adaptação ou sequência é vista, de início, com alguns receios. Acho que isso não se dá exatamente pelo processo de adaptação em si, mas pela quantidade imensa de retornos à materiais antigos que tem acontecido nos últimos anos. Algumas coisas dão certo, ficam boas, prestam homenagens aos originais e trilham uma caminho para si próprias independente deles. Já outras, são um completo desastre. Ficamos com muitos pés atrás, especialmente quando o material de origem é grandioso, popular e adorado por si só, como é o caso de Wicked.
Mas este é um daqueles casos em que a gente respira aliviada. Wicked não só é uma bela adaptação, como também acrescenta camadas à história, algo que pode acontecer quando a trazemos de um meio para o outro - nesse caso, dos palcos do teatro para as telas de cinema. O filme cria uma ambientação de Oz riquíssima em detalhes e espaços que vão além das telas verdes dos efeitos especiais. São cenários em quantidade e especificidades que não são possíveis de se fazer em uma peça, onde o palco é limitado e tudo precisa ter uma certa praticidade para a transição de uma cena para outra. Em Wicked, o diretor Jon M. Chu usa e abusa do que só o cinema pode proporcionar.
Mas no caso de Wicked, isso é, de certa forma, secundário. O coração dessa história, aquilo que faz ela realmente funcionar, são as suas duas protagonistas e a construção da relação entre elas. Talvez esse seja, particularmente, o aspecto mais difícil de adaptar: não é fácil dar conta do legado construído por Idina Menzel e Kristin Chenoweth (que aliás fazem uma bela participação no filme!), ainda mais no cinema. Mas Cynthia Erivo e Ariana Grande roubam a cena. Cynthia é uma veterana de musicais, sendo conhecida por seu papel no musical A cor púrpura e premiada com um Tony Awards, a premiação do teatro estadunidense. Ela brilha aqui Elphaba não só nos números musicais, mas em toda a sua performance, trazendo para a tela a doçura, a timidez, a generosidade, a acidez e a mágoa da poderosa feiticeira. É uma daquelas performances em que você sente a personagem, se envolve, entende e torce por ela - para mim, elementos que são cruciais para ser envolvida por um filme. Ariana, por sua vez, está magnífica em um papel que cai como uma luva para ela: ela é Galinda. Tudo funciona: os números musicais, a postura, o figurino, o ar angelical meio drama queen meio mean girl, e são dela alguns dos melhores momentos de comédia do filme. Ariana é perfeita e as duas tem uma química muito boa que faz sentido em todos os momentos dessa relação. Nem preciso falar do quanto ambas arrasam em todas as músicas.
O elenco como um todo também é ótimo em dar vida aos personagens que circulam pela vida das duas garotas. Jonathan Bailey está excelente como Fiyero, com aquele ar de príncipe encantado, mas cheio de malandragens, boas sacadas e um coração mole. Michelle Yeoh e Jeff Goldblum também se destacam, trazendo muito bem as contradições de seus personagens, duas pessoas já bem experientes nesse mundo que Elphaba e Galinda estão só descobrindo. Menção honrosa também para a dublagem de Peter Dinklage como o professor Dr. Dillamond.
Wicked pega aquilo de melhor do musical e leva para um filme grandioso que é exagerado na medida certa do mundo magnífico que busca criar e, com isso, complementa a história original e a leva para outros públicos que talvez jamais chegassem à peça, seja presencialmente ou pelas gravações que circulam pela internet. O filme foi muito mais divertido e instigante do que eu esperava, prendendo totalmente a atenção durante as suas 2h40 (vá preparado!). É também o tipo de filme bom para se ver no cinema pela possibilidade de viver a experiência coletiva: Wicked é uma história que muitas pessoas conhecem e com a qual já tem uma relação construída. Foi incrível ver quem já conhecia a história muito bem pular de alegria nas fileiras à minha frente.
O filme é divertidíssimo, lindo de ver, esbanja charme e tem muitos e muitos momentos emocionantes, de tirar o fôlego e de deixar a agente arrepiado. É definitivamente uma ótima sessão para acompanhar nas próximas semanas.
Wicked estreia nos cinemas do Brasil nesta quinta, dia 21 de novembro. Veja o trailer aqui.
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