Olá! Esta é uma edição bastante especial porque veio da minha primeira cabine de imprensa! Esses são eventos em que os responsáveis pela distribuição dos filmes e as empresas de comunicação mediadoras convidam a imprensa e os críticos de cinema para uma sessão exclusiva que acontece algum tempo antes do filme ser lançado no cinema oficialmente. Com isso, a gente já consegue ter um material pronto assim que o filme tiver sua estreia para o público. Então, este é um filme andante que está em exibição nos cinemas agora! Essa foi uma cabine promovida pela Imagem Filmes e deixo aqui o meu super obrigada ao pelo convite <3
Apesar de ser uma mega entusiasta das andanças soltas por aí, eu tenho uma certa dificuldade com os trajetos que envolvem deslocamentos maiores. Eu gosto muito de viajar, mas todo o processo de sair de um lugar e chegar no outro ativa os níveis mais irracionais da minha ansiedade. Isso é algo que foi às alturas nesses anos pós isolamento (já falamos um pouco disso aqui), mas não posso dizer que é algo que nasceu nesse período. Há muitos anos atrás, passei mal no caminho da minha primeira viagem longa, que envolvia um ônibus interestadual e a primeira vez que eu andaria de avião. Pode ter sido trauma, ou não, não sei. Só sei que desde então minhas viagens são recheadas de ansiedade, principalmente em todo o processo do antes - da burocracia do planejamento até o trajeto em si.
Mas e se fosse possível pular todas essas etapas? E se fosse possível ir para qualquer lugar do mundo sem ter que se preocupar com preço de passagens, vistos, longas horas de viagem e trânsito?
No mundo de fantasia que existe bem no coração da cidade em O portal secreto (The portable door, 2023, dirigido por Jeffrey Walker), existe uma forma.
Nosso passeio de hoje é pelas ruas agitadas do centro de Londres. Ali, bem aos olhos de todos, existe um grande prédio antigo que abriga a J.W. Wells & Co, uma empresa misteriosa que ninguém sabe dizer exatamente o que faz. Acompanhamos Paul (Patrick Gibson), um cara que precisa muito de um emprego e que, no dia que terá uma entrevista para uma vaga de barista, vê tudo dando absolutamente errado. Ele corre loucamente pela cidade, mas algum obstáculo sempre aparece no seu caminho. No meio dessas desventuras, acaba caindo sem querer em uma entrevista de emprego muito esquisita justamente na J.W. Wells & Co. Ele consegue o emprego e inicia no dia seguinte junto com outra estagiária, Sophie (Sophie Wilde).
Depois de alguns dias, Paul percebe que aquela não é exatamente uma empresa normal e que suas atividades ali envolvem uma boa dose de magia, elementos fantásticos e que ele mesmo tem um poder que não sabia que existia. O CEO da empresa, Sr. Wells (Christoph Waltz, de Bastardos Inglórios), e um dos seus diretores, Sr. Tanner (Sam Neil, de Jurassic Park), o encarregam de uma missão secreta: encontrar um portal que é essencial para os próximos passos da empresa, mas que sumiu. Quando Paul o encontra, descobre que aquela é uma porta que pode levá-lo para qualquer lugar do mundo.
Para onde você iria se pudesse ir com facilidade para qualquer lugar?
Paul e Sophie embarcam em uma grande andança por paisagens desertas de tirar o fôlego. Para duas pessoas que estão no grande cinza de uma cidade como Londres, cheia de dias frios, nublados e chuvosos, acho que faz sentido querer ir para praias quentes e ensolaradas e ver todas as maravilhas da natureza que não são fáceis de acessar, mesmo com bastante recurso para uma viagem comum. Também é conveniente chegar em um lugar que certamente não terá mais ninguém - uma porta aparecendo de repente em uma rua movimentada não passaria muito despercebida.
Acho que, se eu tivesse um portal como esse, iria justamente para o meio das cidades fazer aquilo sobre o qual falamos toda semana: andar e descobrir coisas novas. Eu provavelmente seria aquela com um armário cheio de moedas variadas de cada país, teria um kit de viagem em uma mochila, descobriria a melhor forma de chegar despercebida e iria cada dia para uma andança em uma cidade diferente. Como o meu trabalho é remoto, seria ainda mais fácil de administrar - ah! Acho que hoje estou a fim de ler em um café de Paris ou então vou passar o dia estudando na Biblioteca Pública de Nova York. Minha tese ficaria felicíssima com isso: imagina poder encontrar todo livro que quiser, porque você pode ir em qualquer biblioteca ou livraria do mundo. Se eu quisesse passar o dia comendo muito bem, daria um pulinho em Minas Gerais e, se quisesse matar todas as curiosidades e vontades alimentícias da vida, poderia simplesmente ir em qualquer restaurante do mundo.
(Minhas ambições são andanças, comida, cafés e livros, percebam).
Ver amigos seria um pouco mais difícil, porque ai seria preciso explicar todo esse rolê. Mas lugares mais próximos, como São Paulo, seriam plausíveis e mais fáceis de administrar: ninguém precisa saber que eu não passei 8 horas dentro de um ônibus e minha presença não levantaria suspeitas. Poderia ir em todos os eventos que quisesse, aqueles que acontecem no cotidiano e são mais fáceis de comparecer para quem mora lá. Eu poderia, inclusive, ter vários projetos pessoais de pesquisa: ir em todas as cinematecas do mundo, visitar locações dos filmes que eu gosto, refazer os caminhos de nossos personagens andantes - as possibilidades seriam infinitas. Já fico imaginando a quantidade de feiras de pulgas que eu poderia ir e o quanto eu poderia sair por aí procurando livros e discos, além de várias quinquilharias que eu adoro. E os shows! Imagina a quantidade shows que eu conseguiria assistir!!
(Como vocês podem ver, minhas ambições também envolvem shows, museus, mostras de cinema, temas de pesquisa e coleção de velharias).
É claro que tudo isso demandaria passar altamente despercebida, sem nada de redes sociais e apenas registros físicos de tudo o que aconteceu para ter histórias para contar para os netos um dia - que obviamente achariam que foi tudo uma grande invenção da minha cabeça.
O portal secreto é um filme de fantasia com a clássica jornada do herói, então já é de se imaginar que as coisas vão dar bem errado e que há vilões e mocinhos nessa história, mas que tudo vai dar certo no final. Ele é um daqueles filmes confortáveis e gostosinhos para uma tarde de domingo, quando a gente só quer uma aventura recheada de artefatos antigos mágicos, redes secretas pela cidade e um casarão cheio de cantos escondidos - aquela mágica que a gente conhece muito bem de outras histórias também escondidas em Londres, como Harry Potter e Dr. Who. É um filme que pode agradar um público bem amplo - uma das produtoras do filme é, inclusive, a The Jim Henson Company, responsável pelos Muppets. Mesmo que a fórmula já seja bem conhecida, eu me surpreendi muito positivamente com as escolhas dos elementos que iriam compor essa fantasia, que é baseada em um livro de mesmo nome de Tom Holt (não encontrei tradução dele no Brasil). Aqui não temos exatamente um mundo de magia completamente novo, mas sim a fantasia escondida pelas mesmas ruas do nosso cotidiano, em lugares e com formas que a gente jamais imaginaria. The portable door é o primeiro de uma série de sete livros cujas histórias giram em torno da J.W. Wells & Co, sendo os três primeiros com o personagem Paul.
Além da porta que leva de um lugar para o outro, um dos serviços dessa empresa muito louca é a produção de coincidências para os seus clientes. Sophie faz parte desse departamento e junto com sua chefe, a Condessa Judy (Miranda Otto, de O Senhor dos Anéis), andam pelas ruas de Londres criando situações que juntam - coincidentemente - casais e pessoas que não se viam há muito tempo. Só isso já daria mais uma edição inteira das nossas andanças. Há vários outros temas nas entrelinhas que também levantariam outras discussões, principalmente com relação à trabalho e redes sociais.
Já que eu não tenho uma porta mágica para chamar de minha, venho trabalhando mais ativamente há um tempo minha relação com os trajetos. Houve uma época da minha vida em que eu viaja muito mais e lá eu só atropelava a ansiedade com a pressa e a persona viajada que eu adotei para mim. A gente se acostuma com a prática, é verdade, mas empurrar a sujeira para baixo do tapete não resolve o problema - e quando eu tive que permanecer um longo tempo no mesmo lugar, ela voltou com tudo. Acho que eu já fiz muitos progressos, principalmente nos últimos meses (um salve à medicina chinesa por isso!), tentando apreciar com mais calma e menos tensão o ato de estar no caminho. Em breve eu pegarei de novo aquele mesmo primeiro voo de 10 anos atrás e ele coincidentemente - veja só - marca os exatos início e fim dos meus vinte anos (não tinha percebido isso até escrever esse parágrafo, muito louca essa vida). Talvez esse seja um ciclo se fechando, encerrando um período de ansiedade que eu espero deixar para trás junto com o fim da minha década de vinte.
O entre-lugares é um lugar que pode ser bem legal também.
Enquanto isso, até o próximo passeio :)
Onde assistir
O portal secreto estreou ontem nos cinemas do Brasil com uma distribuição da Imagem Filmes e você pode ver o trailer oficial aqui.
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