#73 Um cafezinho: os filmes que eu mais gostei de assistir em janeiro, fevereiro e março
Dos lançamentos aos clássicos, os filmes que me remexeram nesse começo de 2024
Esse início de 2024 foi um estrondo. Toda semana tínhamos pelo menos um filme novo excelente para assistir no cinema e eu não teria como fazer uma lista dos meus favoritos do ano até agora sem começar por eles. Os principais filmes indicados (e vencedores!) ao Oscar desse ano com toda certeza estão entre os melhores que assisti nesses primeiros meses de 2024: Anatomia de uma queda, Zona de interesse, Pobres criaturas (sobre o qual já falamos na edição #70), Oppenheimer (que foi lançado em julho do ano passado, mas que eu só assisti em uma re-exibição agora em março), Os rejeitados e O menino e a garça.
A lista do Oscar ainda tinha alguns outros filmes, com apenas uma ou duas indicações, que me tiraram o fôlego nas salas de cinema nesse ano. Eles infelizmente acabaram aparecendo pouco na premiação, mas certamente tiveram um protagonismo enorme nas nossas conversas nesses meses. Godzilla minus one (que venceu o Oscar de melhores efeitos visuais) foi uma das grandes surpresas do ano para mim e um dos melhores filmes de monstros que eu já vi. Segredos de um escândalo, com uma história tão polêmica e cheia de nuances, foi um show de atuação de seus três protagonistas - a gente não espera menos de Julianne Moore e Natalie Portman, mas Charles Melton surpreendeu e foi incrível demais junto com as duas. Dias Perfeitos é aquele filme para voltar sempre que o mundo parecer estar desabando, quando a gente precisa de um lugar quentinho para aquecer o coração. E bom, eu já falei aqui sobre o quanto Vidas passadas e Meu amigo robô destroçaram a minha alma (nas edições #64 e #66, respectivamente).
Mas o Oscar é só uma das premiações da temporada e tivemos vários outros filmes incríveis que não foram escolhidos pela Academia. Retratos fantasmas (que também lançou no ano passado, mas que eu só assisti nesse ano, em casa mesmo) traz uma grande andança pelas memórias e pelo passado do cinema de rua em Recife, fazendo a gente lembrar de como as coisas eram há não muito tempo atrás. Monster é uma historia de estraçalhar o coração, contada a partir do ponto de vista da mãe, do professor, e do próprio menino protagonista. Saí do cinema pensando muitas coisas, principalmente no quanto as regras inventadas nessa nossa sociedade deixam marcas tão profundas em nós. Todos nós desconhecidos é outro golpe na alma: fala do luto que jamais vai embora e do quanto o tempo que temos aqui é tão fugaz - tudo isso com uma delicadeza de chorar e atuações que deixam a gente sem palavras.
Se você acompanha essa newsletter, muito provavelmente assistiu algum desses filmes e com certeza ouviu falar muito sobre eles por aí (e alguns desses ainda aparecerão nas nossas andanças muito em breve). Por isso, hoje eu quero falar um pouquinho mais sobre outros filmes que eu também gostei muito de assistir nesse começo de ano.
O meu grande experimento de sair mais para assistir filmes nas salas de exibição ao meu redor segue firme e forte. Só que, ao sair para ir ao cinema, um processo de escolha precisa acontecer e, com tantos lançamentos ótimos, vários outros filmes que eu também queria ver já ficaram para trás - é a lista de tudo aquilo que eu não assisti em 2024 já tomando forma. Em alguns casos, eu também dei prioridade para mostras específicas que estavam acontecendo por aqui. Descobri, pela primeira vez, filmes antigos excelentes que eu nem sabia da existência e tive a oportunidade, que não acontece sempre, de ver na tela grande do cinema alguns clássicos que já estavam na minha lista há tempos.
Eu já falei no nosso último cafezinho sobre o filme Ascensão, que assisti em uma mostra de mulheres diretoras do leste europeu que aconteceu na Caixa Cultural de Curitiba em janeiro. Outro filme dessa mostra que eu também gostei muito foi Conhecendo o grande e vasto mundo (Poznavaia bieli svet, 1978, dirigido por Kira Muratova). Aqui acompanhamos o triângulo amoroso que se forma entre Nicolai (Aleksei Zharkov) e Liuba (Nina Ruslanova), um mais-ou-menos casal, e Mikhail (Sergei Popov), um homem que lhes dá carona na estrada. Eles seguem pelo interior da União Soviética até o lugar onde está sendo construída uma nova cidade, local de trabalho de Liuba. Mikhail acaba ficando por lá também e vamos seguindo com nossos protagonistas por seus sonhos, ideais, desejos para o futuro, esperanças de uma vida melhor e pequenos atos singelos de delicadeza no meio de todas aquelas máquinas e terra remexida. Tem ainda uma cena de casamento coletivo linda logo no começo do filme. Encontrei ele para assistir no Youtube, mas apenas com legendas em inglês.
Nesse ano o Cine Passeio, meu cinema local em Curitiba, completou 5 anos e fez uma programação super especial, com a exibição de vários filmes clássicos antigos e recentes ao longo de todo o dia. Assisti Cinema Paradiso (Nuovo Cinema Paradiso, 1988, dirigido por Giuseppe Tornatore), um filme que já estava na minha lista há muito tempo e que, por alguma razão, eu sempre acabava adiando assistir. E aqui estava eu, mais uma vez saindo aos prantos da sala do cinema ao meio-dia de um sábado.
O filme conta a história de Totó (Salvatore Cascio), um menino que mora em uma pequena cidade da Itália nos anos 40 e que é fascinado pelo cinema de sua cidade, que dá nome ao filme. Ele começa a ficar amigo do projetista, Alfredo (Philippe Noiret), e consegue convencê-lo a lhe ensinar a operar as máquinas na sala de projeção. Não vou além disso, porque foi uma experiência ainda mais incrível assistir o filme sem saber tantas informações sobre ele. É um filme que consegue traduzir em imagens todo o amor pelo cinema manifestado nas mais variadas experiências e relações que temos com ele e faz isso com tanta delicadeza e carinho que eu me arrepio só de lembrar. Fiquei muito emocionada durante o filme inteiro e o final acabou comigo. Um dos melhores filmes que eu já assisti até hoje. Está disponível para alugar no Youtube (mais barato) ou na Prime video.
Menção honrosa também para os curtas de Alice Guy-Blaché, que assisti em uma mostra de Cine Concertos também na Caixa Cultural. É muito interessante pensar que todos esses curtas foram feitos há mais de cem anos atrás em um processo de experimentação daquilo que já é muito estabelecido para a gente hoje. Alice não foi apenas a primeira mulher diretora, mas também alguém que revolucionou a história do cinema ao fazer o primeiro filme narrativo de ficção (leia mais sobre ela aqui), além de ser super divertida e afiada em algumas críticas. Você pode assistir alguns curtas dela na Mubi.
Mas, assim como todo experimento de longo prazo, esse meu também oscila. Às vezes, nos dias em que eu poderia ir ao cinema, outros compromissos e pendências surgem e eu acabo não assistindo nada. Ou ainda a vontade de ficar em casa fala mais alto e escolho algo para assistir ali mesmo. O que importa é que aquela resolução de fazer do ato de assistir filmes um ritual tem se mantido - e nisso tenho descoberto (e aproveitado bem) filmes ótimos também em casa.
Assisti Ascensor para o cadafalso (Ascenseur pour l’échafaud, 1958, dirigido por Louis Malle), um filme andante noir do início da nouvelle vague francesa que tem uma história bem peculiar: Julien Tavernier (Maurice Ronet), um funcionário de alto escalão de uma empresa, se apaixona pela esposa de seu chefe, Florence (Jeanne Moreau). Os dois tem um plano que envolve matar o chefe/marido e fugir. No dia da execução, no entanto, o plano dá quase certo: precisando voltar para ajeitar um pequeno detalhe, Julien fica preso no elevador da empresa por todo o final de semana. Enquanto isso, de um lado, seu carro ficou ligado na rua e a florista da esquina e seu namorado decidem aproveitar a situação e dar uma volta nele (já dá pra imaginar que nada de bom vai vir daí); de outro, Florence anda pela noite de Paris a procura e a espera pelo amante que nunca chega. O filme ainda conta com a trilha sonora composta por Miles Davis. Disponível para assistir gratuitamente no Sesc Digital até o dia 24 de julho, junto com outros filmes do diretor que eu ainda quero assistir.
Assisti nesse feriado de Páscoa Never let me go (2010, dirigido por Mark Romanek), outro filme que quanto menos a gente sabe a respeito, melhor. Aqui acompanhamos Kathy H. (Carey Mulligan), Ruth C. (Keira Knightley) e Tommy D. (Andrew Garfield), três amigos que cresceram juntos em um internato inglês nos anos 70. Mas eles, assim como seus colegas, estão ali por um motivo e tem uma função social a cumprir. Enquanto crescem, vão descobrindo mais sobre os papéis que lhes foram designados e como se sentem em relação a isso, ao mesmo tempo que vão descobrindo os sentimentos da adolescência e a vida fora dos portões da escola. A história é uma ficção científica e traz um grande questionamento sobre mortalidade, sobre a descoberta da vida e nossas tentativas de sermos felizes, sobre como nossas escolhas e as dos outros impactam nossos caminhos e sobre como a gente não tem noção, muitas vezes, do quanto a vida é breve. É de acabar com a gente. O filme se baseia em um romance de mesmo nome de Kazuo Ishiguro e, aparentemente, o livro é ainda mais devastador. Disponível para assistir no Star+.
Um curta que eu também assisti em casa nesse feriado foi 27 (2023, dirigido por Flóra Anna Buda), uma animação de 11 minutos com um visual belíssimo. O curta acompanha Alice, uma mulher de 27 anos sem dinheiro e que precisa voltar a morar com os pais e o irmão mais novo, uma criança. Aqui vemos toda a ansiedade, frustração e os desejos sexuais contidos dessa nossa geração que chegou à vida adulta e encontrou um mundo muito diferente daquele que lhes foi prometido. A falta de privacidade, de perspectivas, de possibilidades concretas de construir a vida que gostaria - em meio a tudo isso, Alice foge da realidade o máximo que pode. Percebi que, em um dado momento, fiquei meio irritada com Alice, e percebi que foi uma irritação muito parecida com aquela de Frances Ha e, se você leu aquela nossa edição sobre ele, vai entender esse misto de sentimentos de se ver e não se ver na tela ao mesmo tempo. O curta andante fala sobre se tornar adulta nesse mundo neoliberal de precarização do trabalho e crise de moradia, principalmente no contexto europeu. Disponível na Mubi.
Como sempre, essa edição ficou maior do que eu esperava, mas também esse início de ano merece uma edição especial. Pensei em fazer edições dessas a cada três meses, ao invés de apenas uma edição geral de favoritos no final do ano. Me diga o que acha e também quais foram os seus favoritos do ano até aqui. E, se você já assistiu algum desses filmes de outros anos que citei, me conta o que achou deles! Vou, como sempre, adorar saber as suas percepções. Você pode deixar um comentário nessa edição, responder a esse e-mail ou falar comigo no Instagram.
Enquanto isso, até o próximo passeio :)
Alguns links antes de ir
- Os bastidores de como a edição de hoje foi escrita (alerta de fofura <3).
- Na semana passada falamos de The Bear e há poucos dias atrás veio a notícia de que a 4ª temporada da série foi confirmada. A terceira temporada vem agora em junho nos EUA <3
- Falando nisso, se você ainda não segue a Ayo Edebiri no Letterboxd, não sabe o que está perdendo! Os comentários dela nos filmes são ótimos e eu amo esse de Vidas Passadas (que tem, nesse momento quase 35 mil curtidas).
- Achei lindo esse pôster (russo, eu acho) de Conhecendo o grande e vasto mundo.
- Um perfil cheio de vídeos andantes do centro de Curitiba <3
- Muitos pensamentos sobre a escrita com
.- No final de março aconteceu o 42 Festival Cinematográfico Internacional del Uruguay, na Cinemateca Uruguaya e foi feito esse discurso lindo em defesa do cinema e em apoio ao cinema argentino, que está recebendo ataques e cortes de financiamento pelo governo de Milei. O discurso é em espanhol e não tem legendas, mas dá para entender bem.
- “Um monstro em um filme nunca é só um monstro” uma análise de Gremlins, racismo e xenofobia em um vídeo-ensaio excelente do Ora Thiago.
- Isabela Boscov fala de Todos nós desconhecidos <3
- Dois filmes novos que eu estou curiosíssima para assistir: Falling in love like in movies, da Indonésia (na Netflix) e Do not expect too much from the end of the world, da Romênia.
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Esse ano não assisti a quase nenhum filme (só fui ao cinema ver Duna 2 mesmo, que amei, inclusive). Mas já estou guardando essa edição pra ir atrás dos filmes que você citou (fiquei com vontade de ver tudo hahaha)
Esse ano vi vários dos indicados ao Oscar e desde que minhas aulas voltaram eu quase não consigo mais ver filmes. Ontem retomei o hábito e escolhi Reality, na MUBI. Tô terminando de assistir já já porque tava tarde e cochilei. Adorei suas dicas e tbm nunca vi Cine Paradiso, vou consertar isso em breve. Beijo